domingo, 14 de março de 2021

Amanheci com o pé na cova

Tudo começou com um sonho ruim. Sonhei que estava deitado numa almofada grande e precisava me levantar para ir pra escola; minha mãe me dizia a hora, avisava que eu iria me atrasar, mas a preguiça me dominava; por fim, pergunto se meu irmão já tinha desocupado o banheiro e começo a me arrumar. Naquele remancho, o telefone toca: TRIIIIMMM! “É pra você”, me diz a minha irmã. Enquanto caminho para atender, penso em voz alta: "Tomara que seja alguém avisando que não vai ter aula". Mas que nada, era a mãe de um aluno me pedindo para saber a nota do filho dela. O telefone era antigo, daqueles de disco, estava numa cabeceira ao lado de uma cama de casal, perto de uma área de sol. Em pé, apoiando o fone com o ombro, pego meu celular e começo a procurar as notas do boy. "Só um minuto". Depois de algum tempo, encontro a nota; copio, colo num aplicativo, mas nada de aparecer o resultado. O minuto havia se passado. Tento novamente, e nada. Daí repito tudo de novo, agora narrando o que ia fazendo para que ela ouvisse que eu estava tentando, e enquanto eu pelejava, pensava: "Meu Deus, vou acabar os créditos da mulher". Mas nada. A cena se repetia; havia entrado em looping. Depois de muita agonia, disse que a planilha estava bugada e não tinha como informar a nota. Foi aí que eu acordei. Ainda estava escuro, mas eu estava completamente desperto. O sonho ainda me atormentava: "Por que eu não fui direto para o computador? Por que eu não pedi para ela me ligar depois?". Não sei. Minha boca estava seca e então percebi que continuava na mesma posição em que dormia, com o cotovelo pra cima e as costas da mão pressionando o olho direito. Comecei a ficar preocupado. Acordar no meio da noite não é um bom sinal para mim; geralmente é dor de barriga. "Deve ser xixi", mas não estava sentindo a bexiga cheia; mesmo assim levantei e fui urinar. Bem menos do que o de costume. "É, não foi por causa disso que eu acordei". Decidi olhar a hora: 5h05. "Devo ter ido dormir cedo ontem", mas não conseguia lembrar a hora em que havia me deitado. Cheguei à conclusão de que fora depois da meia-noite. “Tem alguma coisa errada”. Ajoelhei e orei; lembrei que nesse horário a fila é menor. Deitei novamente, mas era impossível dormir. Comecei a sentir fome; hora de cuidar. Acendi a luz da cozinha, tomei minha água com limão e botei o cuscuz pra hidratar. Senti a primeira pontada. “Dor de barriga, não falei?”, mas nada; só trovão. Fiz o cuscuz, fervi o leite, juntei tudo na tigela, e enquanto o cuscuz inchava, botei um vídeo sobre política. Comi tudo, mas não aguentei assistir ao vídeo todo; estava impaciente. Definitivamente, tinha algo errado comigo. De repente, comecei a suar; tirei a camisa. Pouco tempo depois, comecei a sentir frio; coloquei de volta a camisa. Daqui a pouco eu estava sentindo frio e calor ao mesmo tempo. A inquietação aumentava. Andava de um lado para o outro sem saber o que fazer e sem conseguir raciocinar direito. “Acho que vou desmaiar”. Me deitei, mas não conseguia ficar deitado. Bateu a segunda pontada; e agora sim, a caganeira estava garantida. Depois dessa, fui mais três ou quatro vezes. Decidi tomar um ‘veda-rosca’: água, goma e limão. Deu certo. “Se pelo menos eu tivesse um Rivotril”, mas não tinha nenhum. Pensei em pedir emprestado; mandei um zap: “Tô me sentindo muito estranho, você tem Rivotril aí?”. Mas nada de resposta. Pensei em comprar uma Ivermectina; sabia que não tinha nada a ver, mas poderia ter algum efeito psicológico; na minha cabeça, aquilo era uma crise de ansiedade. Comecei a me arrumar, mas cadê coragem pra ir à farmácia? O telefone tocou; era a minha mãe: “Venha aqui pra tomar um cafezinho com bolo”. Mas eu já havia tomado café. “Vou não”. A gastura continuava. “Meu Deus, eu vou morrer. Adeus, Fumaça!”. Botei na cabeça que precisava cuidar de umas coisas. Esvaziei todas as lixeiras, me livrei de uns flagrantes, juntei três sacolas de lixo e desci lentamente pelas escadas. “E agora, quem é que vai cuidar do gato?”. Na volta, o interfone tocou; era o porteiro avisando que tinha um pedaço de bolo pra mim na portaria. Estava tudo fora do comum naquela manhã. Desci novamente pelas escadas, peguei o bolo, fiz um café e comi pensando que aquela poderia ser a minha última refeição. Levantei, escovei os dentes, e súbito, passei a me sentir melhor. Finalmente, chega a resposta do zap: “Tenho não. O que houve?” Passei a relatar os sintomas, cada um numa mensagem: “Tô melhorzinho agora, mas tive foi ruim. Uma sensação estranha. Ora com calor, ora com frio. Impaciente. Sensação de iminência de desmaio. E caganeira. Caganeira é uma palavra engraçada”. Em menos de 1 minuto veio o diagnóstico: “Homi, isso é pressão baixa”. Será? Como eu não pensei nisso antes? Fui pesquisar no Doctor Google e não deu outra; os sintomas batiam certinho. “Meu Deus, eu vou viver”. Agora tudo se encaixava; a caminhada pelas escadas e o bolo haviam feito a pressão voltar ao normal, por isso eu tinha sentido a melhora. Hehe, não vai ser hoje. “Cancela o testamento”.

 

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